terça-feira, 24 de outubro de 2023

COLO-CASA


 Há um colo maternal expectante

Eu sei... Espera por mim!

Sonho o calor de um peito ofegante de amor

Uns dedos carinhosos percorrendo o meu ser

Eu sei... Sou eterna criança!

Quero o Teu colo que

eu sei... Aguarda por mim de braços abertos

Será ninho de acolhimento, cura para as mágoas, balsamo e unguento para a minha alma

E as feridas esvanecer-se-ão para sempre.



segunda-feira, 16 de janeiro de 2023

Recomeços

 

RECOMEÇOS

 

Apetece-me começar do nada

O passado para trás, o futuro à espreita, distraído

Caminhar de olhar forte, passo firme nesta jornada

Encontrar o meu lugar, o porto de abrigo

 

Algures entre as searas de trigo, o campo das papoilas e o zumbido dos insetos

O recomeço habita em mim em cada nascer do sol

Em cada manhã, que interpreto nos seus diferentes dialetos

No bater de asas de uma andorinha ou no cantar do rouxinol

 

Recomeços são os dias, sucedendo às noites, o nascimento à morte

Há que morrer para renascer

É esse o nosso passaporte

A semente acaba sempre para depois florescer

 

Tantas vezes morremos por dentro

Para virar uma nova página do livro da vida

Basta seguir o coração, o nosso centro

E nunca ficarás desiludida

 

Anseio pelo grande recomeço

O meu porto de abrigo tórrido, com cheiro a terra molhada,

O solo corado pelo sol, o brilho das estrelas que enalteço

Toda a natureza entoará em coro uma desfolhada

 

Recomeça sempre, não desistas!

Quando uma porta se fechar, outra se abrirá

Não sejas saudosista

E a vida te sorrirá

 

Não deixes escapar o recomeço!

Será uma nova oportunidade

Talvez um grande endereço

Que te traga serenidade




segunda-feira, 12 de dezembro de 2022

A magia do Natal


 Desta vez,  seria uma noite de Natal diferente.

O avô Bernardo queria fazer uma surpresa aos netos. A casa

cheirava a canela e gengibre. Erva doce pairava no ar. 

Luzes e estrelinhas douradas e prateadas adornavam o ambiente. A árvore de Natal erguia-se, como que querendo furar o tecto e chegar ao céu.

As prendas, a pedirem para serem rapidamente abertas, os papéis quase a descolar de ansiedade.

À meia noite, avós, netos, filhos e pais reuniram-se à volta da árvore. Maria e João, os mais pequeninos, saltavam de alegria. Música de Natal, envolvia, encantando, o espaço. 

Toc, Toc - bateram à porta.

Olharam uns para os outros, espantados.

-Maria, vai abrir a porta! - disse o avô Bernardo, com ar comprometido.

A pequenita, de imediato, obedeceu ao avô.

-Quem será? A esta hora? No dia de Natal... - perguntavam todos.

Eis que o Pai Natal, gordo, enorme, barbas sem fim, tentava a custo entrar na casa, perante o

olhares arregalados. Trazia um saco às costas que só podia entrar de rojo e com ajuda de todos. 

As crianças ficaram de tal modo extasiadas, que, sem saber como, como por magia, num  piscar de olhos, treparam o abeto, o esqueleto da árvore de Natal. 

De repente, veem-se no telhado, a tocar as estrelas. 

Espreitam ainda pela chaminé. 

-Afinal, o pai Natal não desceu pela chaminé!  - diz João a Maria, ainda confuso. 

-Vamos depressa para baixo! Antes que ele se vá embora! 

Escorregam pela chaminé. 

Um colo aconchegante, gordo, macio, rodeado de cabelos brancos, como palhinhas da manjedoura do menino Jesus, esperava por eles, negros da fuligem. 






segunda-feira, 10 de outubro de 2022

Amanheces em mim



Descanso nas sombras das árvores e sou neta dos raios de sol que me aquecem esta pedra fria, onde escondo as águas  de um algibe. Chovo, sou fonte  para os sequiosos. 

Verde, amanheces em mim, com a frescura da geada e nevas. Recolho-me nessa nívea ternura.

Ensolas as minhas profundezas em luz. 


Embrenho-me nas copas das árvores e desvaneço.

 Sou apenas  uma rocha dura e tensa, enegrecida pelo tempo. Não acordo nem adormeço, nem trovejo nem ilumino. 


segunda-feira, 9 de maio de 2022

És do mar e das estrelas


 Meu amor,

Sei que dormes no fundo do mar e habitas junto às estrelinhas.

Danças com os peixinhos e embalas-te ao sabor da música das estrelas.

O azul é o teu mundo e maravilhas-te quando encostas o teu dedinho na ponta da luzinha que brilha lá no alto.

Eles não sabem. Chiu!!! Não façam barulho! Podem acordar o azul onde moras!

E nós só queremos, tu e eu, ficar aqui no silêncio, embaladas pelo Universo que é Luz.

Tu és a luzinha mais brilhante da minha Vida. Deixa-me ficar aí contigo! 

Truz, truz! Posso entrar? 

sábado, 29 de janeiro de 2022

Memórias apagadas


 As noites despediram-se dos dias

As memórias deitaram-se no regaço da poesia e descansaram

Já esqueci os dias e as noites perduram nas folhas em branco que esqueci de escrever

Sei tanto do tudo e nada do nada

Agarro-me às cinzas do que sou para renascer um dia qual Fénix sem nome

Abraço a Fé e a Esperança ainda é um oásis no deserto a alcançar 


terça-feira, 7 de dezembro de 2021

Salvador

 SALVADOR

Mais um dia. Sinto o estômago quase colado às costas. Salvador é o meu nome. Que ironia! Salvador? Eu que quero ser salvo desta miséria onde chafurdo todos os dias. Há dois dias que só como uns restos de pão duro. E este frio? Morro congelado! Se ao menos alguma alma caridosa, desses voluntários que andam por aí, me trouxessem uma manta. Mas nem enxergam a minha presença. Chego-me ao Coxo, dorme a meu lado, roncando, indiferente a tudo. O ar é nauseabundo. Tapo-me com um cartão que encontrei na rua, perto dum armazém velho. 

Salvador - Ironia dos meus pais! Abandonaram- me em pequeno, quando viram que não me conseguiam sustentar. Menos uma boca... Sim, salvei-os do sustento de mais uma boca! Vagueei pelas ruas, perdido, e ia enganando a fome com aquilo que ia conseguindo roubar das mercearias ou encontrar por aí. Cheguei a vasculhar os contentores do lixo e às vezes lá encontrava uns restos de massa, arroz ou carne putrefacta. 

Salvador, eu? Quem me salva deste frio que me congela o corpo e desta fome que me engole as entranhas? 

A minha casa é uma cave submersa duma ponte desta cidade. Moro com o Coxo, o Zarolho e o Drogado. Boa gente. Gente a ser salva. Mas eu não faço jus ao meu nome. Nem nenhum deles, nesta vida.

Está tanto frio! O meu cérebro está a congelar, já nem sinto as mãos, e os meus pés são como pedras de gelo que não consigo mexer. O cheiro à minha volta é um misto de odores a gasóleo, fumo, suor e dejetos podres. Acabo por adormecer, nauseado. Sinto-me muito fraco, anestesiado pelo frio, a fome, os cheiros. Quero morrer!

 - Salvador, acorda! Está na hora de ires para o trabalho. - Estranho esta voz feminina tão familiar. Soa como música para os meus ouvidos. Desperto. Foi só um pesadelo!

 Cheira a pão torrado, a café acabado de fazer, ouço o crepitar da lenha na lareira na sala. Aninho-me neste conforto. Preciso sentir que é mesmo real esta cama quente onde estou deitado. Sinto a alma mais reconfortada, agora. Suspiro de alívio. Estou vivo e escapei de um pesadelo! Vislumbro o sorriso mais amoroso, os olhos mais ternos, do mundo, a minha salvadora: 

 ─ Bom dia, paizinho! ─  Dá-me um beijinho no rosto. Sabe-me a doces de Natal, daqueles feitos com amor no fogão quente da nossa mãe. Suspiro. Afinal ainda terei oportunidade de salvar alguém, nem que seja


do frio da noite negra. Nunca se sabe se o céu nos poderá cair em cima. A qualquer um de nós. De um momento para o outro.