segunda-feira, 28 de novembro de 2016

SONHO



No silêncio ensurdecedor da noite, perante o sussurro das paredes brancas e os gritos carunchosos dos móveis, adormecia e sonhava...
Tentava agarrar os sonhos e transcrevê-los para as folhas brancas, vazias, do livro da vida...
Arrancava dos sonhos as folhas rascunhadas, sujas de tinta e reescrevia-as com tinta sanguínea do coração...
Acordava, agarrando as manhãs, ao respirar das madrugadas, e sentia o fôlego trazido pelo vento para renascer num novo dia...
Agarrava os dias com as  forças que encontrava na promessa de dias de Luz...
Até que a noite se debruçava sobre ela para lhe contar ao ouvido segredos de amor...

quarta-feira, 23 de novembro de 2016

Vida



Vida que corre nas veias, rubra, inundada pelo néctar vibrante de fogo escarlate
Pulsante coração de uma alma perdida, esquecida, viajando nos meandros dos tempos
Busca caminhos no ritmo das águas nascentes no parto quente de Deus
Luz que vislumbro intermitente num país que não habito
Senda que percorro para encontrar o mais Alto e Poderoso
Magnificência sobre a face oculta do meu Ser ao qual pertenço mas não me dou
Matéria que se move numa Terra estranha
Procura constante de mim...


terça-feira, 22 de novembro de 2016

Reencontro



Encontraram-se as duas no cais da vida...
Maria menina
Maria mulher
Olharam-se
Já quase não se reconheciam...
As marcas do tempo  estampadas  no olhar...
Olharam-se e viram-se!
Maria menina trazia uma mala cheia de muitas cores de sorrisos, muitos perfumes de risos, muitas borboletas de alegria, muitos sonhos desenhados, muitas flores de esperança e muitos doces de inocência...
Maria mulher  carregava uma mala pesada na bagagem...
Nela trazia toneladas de livros escritas com lições de vida, várias espécies de caixas de desilusões, cofres de segredos fechados a cadeado, sacos de amores frustrados, versos de sonhos desfeitos...
Caminhavam lado a lado no cais da vida...
No meio do cais, Maria mulher deixou para trás Maria menina, esquecendo-se dela...
Naquele dia, porém, encontraram-se nesse cais da vida, olharam-se e recordaram-se...Maria mulher desfez a sua bagagem e deixou para trás...
Agora caminhava lado a lado de mão dada com Maria menina nesse longo cais da vida!...

sábado, 19 de novembro de 2016

Encontros e desencontros



Encontros e desencontros nas esquinas da vida...
Pegadas na areia da praia apagadas pelas ondas do mar...
Sonhos desfeitos...
Farrapos de folhas secas de Outono numa alma cansada...
Atiradas ao vento...
Vazios deixados na cadeira do tempo...
Encontro num abraço
Desencontro  da indiferença fria de alguém que passa na nossa linha da vida...
O  comboio sempre retomará  a sua viagem em busca dos sonhos desfeitos nos desencontros da vida...

quarta-feira, 16 de novembro de 2016

Apocalíptico



Naquele dia acordou mais cedo...
Inexplicavelmente, sentia-se agitada...precisava sair, algo se passava lá fora, tinha a certeza disso!
Espreitou pela janela e o que viu provocou-lhe um arrepio, um misto de susto, fascinação e esperança!...
A luz da manhã brilhava intensamente, como nunca tinha vislumbrado na vida...quase queimava a vista! Flores cresciam por todo o lado a um ritmo frenético... Inúmeras naves espaciais espalhavam-se pelo solo e delas saiam pequeninos seres inundados em Luz de olhos enormes que se abraçavam, rindo e brincando, intensificando a Luz..
No parapeito da sua janela espreitava um desses pequeninos seres luminosos...
O pequeno ser de Luz aproximou-se do seu ouvido...o primeiro instinto, que tinha sido de medo, desvaneceu-se imediatamente...Uma enorme Paz envolveu o seu ser!
Agarrou-lhe a mão com a sua mão brilhante e macia e perguntou-lhe:
- Queres vir comigo para o Planeta dos Afectos...Há muito que aqui neste planeta Terra se  esqueceram dos afectos. Os homens esconderam-se atrás do medo e o amor foi esquecido...os humanos afastaram-se, não mais se beijam, se tocam, se abraçam, se amam..as flores murcharam!,,,
No meu Planeta todos estamos ligados pela Luz do Amor, não existe medo...o Todo é Tudo e o Tudo é Um...não há medo, pois nada está separado! Vivemos dentro dessa Luz...
E, agarrando-lhe a mão, entraram  na nave que oos transportaria ao Planeta do Amor...


sábado, 12 de novembro de 2016

Pintei-te num quadro



Pintei-te num quadro e pendurei-o na sala do coração com a janela entreaberta
Entraram e saíram pinceladas com a  brisa de vento através da janela semicerrada...
Um dia acordei...
Tinha-te sonhado no quadro completo
Nesse dia tentei desenhar-te inteiro...
Mas o ruído da estrada entrava pela janela entreaberta e esqueci-me do teu rosto...
Entreguei a pintura do teu quadro ao Sonho...
Talvez possa ele rebuscar-te na tela que agora permanece vazia e gasta pelos anos...
Sabia os teus traços, pois ardiam vivos dentro de mim, tentando sair
E no quadro permaneceste um esboço, aguardando pincéis de cores vibrantes que te tatuarão em mim...
Guardo-te na memória das minhas cores...


quarta-feira, 9 de novembro de 2016

Sombras do ser




Todos os dias cresço...
Comigo vão crescendo os pelos da alcatifa da sala, impregnada dos meus passos, cresce o pó acumulado nos livros que me observam nas estantes, ansiosos por me dizerem as palavras que dormem esquecidas nas páginas...As plantas vão crescendo ou murcham, como que respondendo aos estados de alma que por ali vagueiam...
Os móveis ficam enormes perante a pequenez do meu Ser e a luz brilha, trémula e doce...Pelos poros das paredes pintadas jorram sonhos e gritos de socorro...agarro-me à almofada e sonho, perante o miar do gato que adormece aos meus pés, pelo espanto do silêncio que invade a casa...
Os cheiros vão e vêm por entre velas ou incensos...o jantar tarda pela espera da companhia, e acaba por torrar no fundo de uma panela gasta pelo tempo...a casa arrumada e a visita que nunca chega!...
Então a solidão agiganta-se e toma a forma das sombras...adormeço ao som dos acordes dos anjos...
Acordo e adormeço no ritmo cadenciado dos dias...esqueço-me de mim ou encontro-me...e no silêncio cresço e abraço-me! No colo dos deuses encontro o Amor!

terça-feira, 8 de novembro de 2016

Marioskas



Sou uma Marioska...
dentro de mim tenho Marias de todos os tamanhos
Maria menina
Maria senhora
Maria sonhadora
Maria criança
Mariazinha
Maria grande
Maria triste
Maria alegre
Maria brincalhona
Maria séria
Maria pequenina
Maria bébé
Maria velhota

(..e tantas Marias na Marioska da vida...)

sexta-feira, 4 de novembro de 2016

À procura da felicidade



Com a pressa de alcançar a felicidade
quantas vezes tropecei nas pedras do caminho!...
Quantas vezes me estatelei no chão e me levantei!...
Estranha quimera esta ilusão da felicidade!...
Que conquista efémera que se persegue em vão!...
Onde está a felicidade?
Será palavra inventada, sussurrada ao vento, momento fugaz, frase balbuciada, ou simplesmente nada?
Um dia encontrei-a...
estava quieta e calada ...
encontrei-a no sorriso  de uma criança, no cantar dos pássaros, no bulício das copas das árvores ao vento, no perfume das flores, no barulho das ondas batendo na praia...e deixei-me ficar na felicidade dos pequenos nadas...que são tudo!